sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Moby_Dick adaptado para leitura


“Moby-Dick” em três horas e quarenta e cinco minutos
a partir de Herman Melville
adaptado por Tiago Patrício, em colaboração com Pedro Alves

«A BALEIA BRANCA
Narrativa de aventuras para alguns, epopeia metafísica para outros, «Moby-Dick», de Herman Melville, pode ser resumida como a história de uma viagem de caça à baleia, um estudo sobre a obsessão e a vingança e como estes traços dominantes se tornam a ruína do homem. Uma narrativa fragmentada, em certo modo, desordenada, dinâmica, entretecendo diferentes modos literários: conto, sátira, drama, ensaio, enciclopédia, crónica, lírica… Numa primeira fase do texto (e aqui serve-nos tão bem a teoria cíclica da História tal como foi desenhada por Vico!), acompanhamos o narrador Ismael nos preparativos para a viagem. É o tempo dos mitos, dos monstros e em que a luz vai rasgando as trevas primordiais. Naquilo que podemos considerar a segunda parte, um tempo dos heróis, a bordo do navio Pequod, Ismael abandona o papel central da narrativa e o foco é deslocado para Ahab e para a sua perseguição à Baleia Branca. E é tão interessante que os heróis desta grande narrativa fundadora dos EUA sejam marinheiros, arpoadores, ferreiros, cozinheiros, loucos tamborileiros, comandados por um influente capitão monomaníaco! Num terceiro momento, Ahab parece medir forças com o segundo oficial do Pequod, o racional e prudente Starbuck. No entanto, no derradeiro andamento do texto, é já inevitável o confronto destruidor com a Baleia Branca, que terminará de forma caótica, com a morte do Capitão Ahab e de toda a tripulação do Pequod, à exceção de Ismael. Terminada a saga marítima fica esboçada uma nova viagem (il ricorso), em que Ismael, num gesto maneirista ao melhor jeito de Shakespeare, é recuperado como narrador.

A Baleia, indefinida, secreta, ilimitada, mistério e vertigem, acaba por constituir a analogia da própria obra literária de Melville – e, talvez, também do nosso próprio espetáculo. Ahab é descrito como uma personagem monomaníaca, figura satânica, guiada por um único objetivo, capaz de vergar tudo e todos pela paixão que lhe arde no peito, a sede de vingança, a vontade de destruir Moby-Dick. Ahab é um ser atuante, narcisista, por oposição a Ismael, face a Moby-Dick (objeto-texto-fantasma). Não pensa, apenas sente, tal como o próprio afirma no início do seu último dia de caça à Baleia. Enquanto Ahab persegue ébrio de paixão, o fantasma do seu próprio espírito, Ismael segue-o, distanciado, permitindo que este (o fantasma-baleia) se revele em toda a sua plenitude. Se para Ahab o mar é a onda que o transporta para o confronto com Moby-Dick, para Ismael o mar representa as ilimitadas ressonâncias/ cogitações de que a Baleia se faz eco. Ismael é um narrador consciente do seu papel e, ao contrário de Ahab, faz uma viagem não contemplativa ou fantasista ao encontro do absoluto (Moby-Dick), para logo o perder, porque nunca o atinge. Ahab, Ismael e até mesmo Starbuck não são homens sozinhos. Dependem das relações que estabelecem uns com os outros. O navio Pequod (outra personagem?), à semelhança do Bellipotent em «Billy Bud» ou o San Dominick em «Benito Cereno», acaba assim por funcionar como pequena «ilha» de homens perturbados, uma imagem microscópica do mundo como «navio [como palco] numa viagem sem regresso».

MOBY-DICK
A narrative of adventures for some and a metaphysical epic for others, Melville’s ‘Moby-Dick’ may be summarized as the story of a whaling trip, a study on obsession and revenge and how these dominant human traits become the man’s bane. A fragmented but, at the same time, disorderly and dynamic narrative, it assumes different literary modes: satire, drama, essay, encyclopedia, chronicle, lyrical.


The performance premiered on 19th November 2013 at Casa de Teatro de Sintra (in Sintra, Portugal). Since then it has been presented all over Portugal and in the USA, at the Access Theater (in New York) and at the New Bedford Whaling Museum.

Disponível na Traga-Mundos – livros e vinhos, coisas e loisas do Douro em Vila Real... | Traga-Mundos – lhibros i binos, cousas i lhoisas de l Douro an Bila Rial...
[também disponíveis as seguintes obras do autor: “Cartas de Praga | Letters from Prague”, "A Memória das Aves", “Retratinhos vol. 1” com Jorge Palinhos e Alexandre Sarrazola, “O Direito à Revolta (português) | The Right to Revolution (english) | El Dret a la Revolta (català)”, “Turismo de Guerra”, “Checoslováquia”, "Pavilhão K Terminal C", "As Portas da Cidade", “Cantina Velha”, “O Livro das Aves”, “Trás-os-Montes”, “O Estado de Nova Iorque”, “Mil Novecentos e Setenta e Cinco”, “O Princípio da Noite”, "O Poeta Na Cidade"]

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